sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Sobre o evitar

Ironia, se chamava Teadora... O pai dizia que era um erro - triste - de registro. Ela tentava não lembrar. Nunca gostou muito disso, daquilo, de querer bem aos outros. Era uma estranha em meio a tanto amor que havia dentro de casa, dentre as pessoas, fora de tudo. Amor é coisa tanta que até sufoca, quando não cessa, não abre brecha para um pouquinho que seja de desprezo, de angústia.
Cansava sempre que subia escadas de mais de dois vãos. Em vão, tentava conter a sede ao abrir a porta da casa de Dona Pinha, uma senhorinha para quem ela dedicava alguns minutos desgastados por semana. Escondia também a sofreguidão piscando devagar os olhos, como quem não tem muito o que fazer além de piscá-los por longos minutos. Mas Dona Pinha, que nada de boba tinha, sabia do alvoroço com que Teadora percorria todos os dias três longas avenidas até chegar no colégio, extremamente ensopada de suor e suplício. E tudo isso para evitar...
Evitava ônibus, metrô e o que fosse considerado necessário para encurtar trajetos. Talvez fosse um medo latente de prender ou perder-se, em meio a tantos rostos estranhos que, do alto ou do baixo, pareciam lhe dizer para fugir, rápido, fugir de vez dali.

(continua...)

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