quinta-feira, 4 de abril de 2013

Sobre voar

Tinha se acostumado a chorar em público, como quem suspira ou olha pro lado, sem nenhum alarde. Chorava em pátios, esquinas, sofás de festa e até em meio ao caos de qualquer trânsito, com os vidros bem abertos. Todos os lugares recebiam bem suas lágrimas, que ali ficavam.
Em casa, não chorava, era rude consigo mesma. Nem quarto, nem sala, nem cozinha. Simplesmente nenhum espaço, que era tão seu, merecia tal penar. Aquela dor toda que a consumia no mundo ficava do tapete pra fora, onde arrastava o pé com força de quem diz, em silêncio e gesto, não estar disposta a levar mágoas para casa, para dividir a mesma cama.
Sabia, assim, o não-lugar de todo rancor que ia arrecadando em cada espaço geográfico que adentrava, cada sala que rompia. Não sabia, porém, onde enfiá-lo, nem mesmo como encontrar esse lugar que diz sim pr'esse emaranhado de coisa ruim que fica entalado na garganta, sufocando.

(continua...)

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